domingo, 27 de abril de 2008

Por um iraquiano-brasileiro


Bagdá ...Oh Bagdá

por Khalid Tailche

Destruíram meu país
e nas suas ruínas
implantaram o terror

Araram a terra com as bombas
e irrigaram suas diabólicas ervas
com as lágrimas das viúvas


Bagdá...
terra da alegria e da música
terra de ciência de literatura
tornou-se a terra de lamúria

Suas portas estão abertas
para o vento amarelo
Suas ruas são refúgios
para os lobos frenéticos
e os bêbados de sangue

Bagdá, Oh Bagdá
roubaram sua riqueza
e expulsaram seus filhos
e não deixaram em ti
pedra em cima de pedra

Tivemos paciência
seja paciente
Para cada doença há remédio
e para cada criminoso há destino


Originalmente publicado
aqui.

terça-feira, 22 de abril de 2008

Do meu "si"

Sinfonias de panelas ao fogo
Auto suficiência ilusória
Solidão acompanhada
Jornada fadada
Asfixia ao ler manchetes
Taquicardia ao ler Pessoa
Leitura velada
Silêncio na angústia
Rebeldia na persistência
Alegria provisória
Infelicidade medida
Existência descompassada

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Da solidão expandida


A nitidez dissipa as partilhas e torna meu caminho verde só. É doce de liberdade, triste e feliz (não havendo aí oposição). Fiel, fértil, febril, freqüente. Se me estorva por vezes. Mais do que resisti; insiste, fecunda e me elucida. Faz do correr áspero; mental do tempo. Faz da vontade possibilidade, alimenta e consome. Unidade, ceticismo, saudade, piedade de nós que elegemos submergir.

domingo, 13 de abril de 2008

Inútil tomada de consciência prévia ao sono

A lembrança das cabeças desprotegidas no tempo
A carne ora a derreter na sequidão, ora a trincar no vento frio
Mais uma manhã regular
E tantos corpos pelo chão

Vidas potenciais sofridas pelos cantos
Buscando nada além do que o urgente:
Sustento imediato para ossos duros e peles grossas

Quase zumbis num vagar incômodo
Causando "credos" de asco
Desengasgando de cútis hidratadas - e muitas ocas - "ais"
Mistos de culpa e dó.

Pois consome, come, cala
Remedia, adia
E dorme.

Dust of Snow

The way a crow
Shook down on me
The dust of snow
From a hemlock tree
Has given my heart
A change of mood
And saved some part
Of a day I had rued.
Robert Frost

sábado, 12 de abril de 2008

Das mortes que há na vida

Só os sonhos me permitem

Frações medidas de alma em euforia

Nos dias claros me vejo cindida

Tanta morte há na lida!

E de repente já não há lar

A labuta não me aflige

(sequer fatiga)

Me vejo ébria

E sou livre

Mas num minuto de percepção

Se esmaece a fantasia

Me vejo sóbria

E sou triste

O caminho não trilhado

Apesar desse poema do Robertão ser um dos mais famosos e verdadeiramente maravilhoso, ele ainda não é o meu preferido. Mas este ficará para outra ocasião… enjoy!

The Road Not Taken

Two roads diverged in a yellow wood,
And sorry I could not travel both
And be one traveler, long I stood
And looked down one as far as I could
To where it bent in the undergrowth;
Then took the other, as just as fair,
And having perhaps the better claim,
Because it was grassy and wanted wear;
Though as for that the passing there
Had worn them really about the same,
And both that morning equally lay
In leaves no step had trodden black.
Oh, I kept the first for another day!
Yet knowing how way leads on to way,
I doubted if I should ever come back.
I shall be telling this with a sigh
Somewhere ages and ages hence:
Two roads diverged in a wood, and I-
I took the one less traveled by,
And that has made all the difference.

Robert Frost

Gotas de Água Viva

Depois da labuta, das compras, da festinha e do retorno ao lar, não sei por que raios, me vi parada na frente da estante olhando para um livro. Era o Água Viva da Clarice. Recordo que comprei esse livro na Laselva do aeroporto de Congonhas e o li de uma única sentada durante um vôo desses curtinhos. Fiquei extasiada com o modo como alguns pensamentos íntimos e subjetivos (tão subjetivos que parecem mais borrões de sentimentos) foram dissecados. Abri o livro e reli ostrechos grifados. E só assim se completou o meu dia. Agora já posso ir dormir.
*
*
“Domingo é dia de ecos - quentes, secos, e em toda a parte zumbidos de abelhas e vespas, gritos de pássaros e o longínquo das marteladas compassadas - de onde vêm os ecos de domingo? Eu deteso domingo por ser oco.”
*
“O dia parece a pele esticada e lisa de uma fruta que numa pequena catástrofe os dentes rompem, o seu caldo escorre. Tenho medo do domingo maldito que me liquifica.”
*
“Dor é vida exacerbada. O processo dói. Via-a-ser é uma lenta e lenta dor boa. É o espreguiçamento amplo até onde a pessoa pode se esticar. E o sangue agradece. Respiro, respiro.”
*
“É que os seres excepcionais em qualquer sentido estão sujeitos a mais perigos do que o comum das pessoas. (…) E eu tava tão feliz que me encolhi no canto do táxi de medo porque a felicidade dói.”
*
“Agora sei: sou só. Eu e minha liberdade que não sei usar. Grande responsabilidade da solidão. Quem não é perdido não conhece a liberdade e não a ama. Quanto a mim, assumo a minha solidão. Que às vezes se extasia como diante de fogos de artifício. Sou só e tenho que viver uma certa glória íntima que na solidão pode se tornar dor. E a dor, silêncio.”
*
“Mas eu denuncio. Denuncio nossa fraqueza, denuncio o horror alucinante de morrer - e respondo a toda essa infâmia com - exatamente isto que vai agora ficar escrito - e respondo a toda essa infâmia com a alegria. Puríssima e levíssima alegria. A minha única salvação é a alegria. (…) Porque é cruel demais saber que a vida é única e que não temos como garantia senão a fé em trevas - porque é cruel demais, então respondo com a pureza de uma alegria indomável. Recuso-me a ficar triste. Sejamos alegres. Quem não tiver medo de ficar alegre e experimentar uma só vez sequer a alegria doida e profunda terá o melhor de nossa verdade. Eu estou - apesar de tudo oh apesar de tudo - estou sendo alegre neste instante-já que passa se eu não fixá-lo com palavras.”
*
“Ah viver é tão desconfortável. Tudo aperta: o corpo exige, o espírito não pára, viver parece ter sono e não poder dormir - viver é incômodo.”

Quem conta um conto aumenta um ponto

Quando olho uma figueira, cada folha
tem um desenho diferente.
Cada uma delas tem uma maneira de
se mexer no espaço.
E, no entanto, elas gritam todas,
embora cada qual à sua maneira:
Figueira!
Henri Matisse

Quando vejo a vida como árvore,
cada folha me parece uma pessoa.
Cada uma delas tem uma maneira de
se mexer no espaço.
E, no entanto, elas gritam todas,
cada qual à sua maneira e com ansiedade:
Liberdade!
João Carlos Pecci

Quando vejo o mundo com coragem,
cada pessoa é uma ferida dormente.
Cada uma delas tem uma maneira de
se anestesiar, inutilmente.
E, quase sufocando, elas gritam todas,
cada qual à sua maneira e com ansiedade:
Igualdade!
Lia

Sobre o tempo...

Sei que parece loucura apresentar Dalida e Nana Caymmi no mesmo post, mas proponho reservarmos quaisquer pré conceitos e simplesmente nos deixarmos levar pela sensibilidade, seja ela transmitida pela profundidade da Nana ou pela tristeza brega porém realista da Dalida.

Enjoy!

Resposta ao Tempo (Nana Caymmi)

Composição: Aldir Blanc/Cristovão Bastos

Batidas na porta da frente
É o tempo
Eu bebo um pouquinho
Pra ter argumento…

Mas fico sem jeito
Calado, ele ri
Ele zomba do quanto eu chorei
Porque sabe passar
E eu não sei

Num dia azul de verão
Sinto o vento
Há fôlhas no meu coração
É o tempo…

Recordo um amor que perdi
Ele ri
Diz que somos iguais
Se eu notei
Pois não sabe ficar
E eu também não sei…

E gira em volta de mim
Sussurra que apaga os caminhos
Que amores terminam no escuro
Sozinhos…

Respondo que ele aprisiona
Eu liberto
Que ele adormece as paixões
Eu desperto…

E o tempo se rói
Com inveja de mim
Me vigia querendo aprender
Como eu morro de amor
Pra tentar reviver…

No fundo é uma eterna criança
Que não soube amadurecer
Eu posso, ele não vai poder
Me esquecer…

Respondo que ele aprisiona
Eu liberto
Que ele adormece as paixões
Eu desperto…

E o tempo se rói
Com inveja de mim
Me vigia querendo aprender
Como eu morro de amor
Prá tentar reviver…

No fundo é uma eterna criança
Que não soube amadurecer
Eu posso, e ele não vai poder
Me esquecer…

No fundo é uma eterna criança
Que não soube amadurecer
Eu posso, ele não vai poder
Me esquecer…


C’est fini la comédie (Dalida)

Composição: J.Palmer, K.Ricanek, A.La-Bionda, P.Delanoé

C’est fini, c’est fini la comédie
Tout avait commencé comme une pièce à succès
Dans le décor tout bleu d’un théâtre de banlieue
Nous n’étions que nous deux

On s’est aimé longtemps au point d’oublier le temps
Qui tout au long des scènes transformait les joies en peine
Il a gagné le temps, il est content
Quand il nous voit chacun de son côté comme des étrangers
Nous n’avons plus en commun que les mots quotidiens
Le décor n’a pas changé mais les acteurs n’ont rien à jouer

Il faut baisser le rideau
C’est fini, c’est fini la comédie
On était bien parti éternité garantie
On était seuls au monde devant nous la route longue
Pas de sens interditIl a gagné le temps, il est content
Quand il nous voit chacun de son côté comme des étrangers
Nous n’avons plus en commun que les mots quotidiens
Le décor n’a pas changé mais les acteurs n’ont rien à jouer

Il faut baisser le rideau
C’est fini, c’est fini la comédie
Tout avait commencé comme une pièce à succès
Dans le décor tout bleu d’un théâtre de banlieue
Nous n’étions que nous deux

C’est fini
C’est fini la comédie.

Mais do que uma coincidência lingüística

Dizia eu que a aritmética - brincadeira, mas é impossível não lembrar do lendário Professor Girafales quando se inicia o parágrafo com “dizia eu…” Mas vamos lá: dizia eu ao meu amigo Átila que a exata localização do meu coração é bem no meio do estômago. Desde sempre os maus bocados pelos quais passei se fizeram sentir não no peito, mas no estômago. É ele que se contorce no meio de uma enxurrada de lágrimas; é ele que se vira e revira quando parece já não haver saídas, e é ele que realmente sente as punhadas que nos reserva o destino.

Interessante é que em francês a expressão ” J’ai mal au coeur” significa “Estou enjoado”, ao contrário do que trasmitiria a tradução literal “meu coração está doendo”. Segundo o Átila, antigamente o órgão que levava crédito, ou descrédito, pelas emoções era nada mais nada menos do que o fígado, vulgo figo.

Enfim, uma curiosidade não muito curiosa, mas ao menos digna de uma pausa com cara de conteúdo seguida de uma interjeição como um curto, porém enfático “huh”.

Caso algum leitor tenha dados mais aprofundados sobre o tema, por favor fique à vontade para compartilhá-los conosco, mas não sem antes, é claro, prestar as devidas honras ao post através da pausa previamente mencionada.

Infeliz

Estava um pouco infeliz com o "Dois de óculos" e decidi criar um canto meu aqui no Blogspot. Vamos ver como as coisas se adaptam. Bonne chance à moi!
Bem-vindos ao Lia's Land in the Sky!!!