sexta-feira, 22 de abril de 2011

De volta à África? Ou a Moscou?

Há quase dois anos comprei um livro, o meu primeiro, do angolano Pepetela. Foi indicação de uma amiga: "Se gostas de Garcia Marquez, hás de gostar de Pepetela...". Sabe-se lá por que eu deixei para lê-lo só agora. 
O enredo em si não foi o que mais me cativou na mais nova obra do escritor, mas sim o seu estilo. Moderno, sucinto e estranhamente profundo. Sim, de uma profundidade sutil que não se baseia no uso de termos complicados ou orações longas. Diálogos misturam-se com a voz do narrador e permitem um mergulho nos desejos simplórios - e, no entanto - tão inacessíveis - do nosso herói. A busca do amor impossível por razões políticas. 
Começo a ler um romance de um angolano e logo me vejo em Moscou. Depois na Mongólia. Na Argélia. Em Cuba! Caminhos de revolucionários, de pessoas perdidamente, no sentido denotativo do termo, engajadas em movimentos de libertação de suas pátrias. A política tem dessas. Já dizia Aureliano Buendía, de Cem anos de solidão, que não sabia bem como e por que o posicionamento político de sua família havia sido escolhido. Mas nesta obra de Pepetela o protagonista sabe bem o que o levou a fazer parte do movimento de libertação. O que o torna perdido é o burocrático emaranhado de caminhos que tem que percorrer ao longo da vida. E as inúmeras arapucas que se lhe apresentam. 
Um romance pleno de fluidez, belas imagens e muita sensibilidade. Recomendo e lamento estar numa fase de limitação financeira que não me permite adquirir imediatamente outros romances do autor.

segunda-feira, 18 de abril de 2011

Um floco de neve turco

A Turquia é um país desses que nunca me interessaram em particular. Mas acabei, meio que por acaso, pegando o livro Neve da prateleira da casa de uma amiga. Ela tinha dito que tinha sido escrito por um finlandês ou norueguês. Interessei-me. Cedo, porém, percebi que se tratava de um escritor turco e de um romance ambientado em uma cidade fronteiriça da Turquia. Torci o nariz, mas encarei a leitura. 
Confesso que o romance não me cativou, mas foi bastante interessante mudar de ares. Afinal, tenho vivido na Rússia nas últimas leituras.
Neve trata de assuntos que fazem parte da vida dos turcos, dos islamitas, das mulheres que cobrem a cabeça com mantos. Tudo tão distante de mim... Tudo tão extremamente fora da realidade de um brasileiro, de um ocidental. É difícil pensar em alguns desses assuntos com seriedade, com a profundidade que pedem. Talvez por isso a minha leitura tenha sido tão superficial. Talvez por isso eu ainda me questione por que O. Pamuk ganhou o prêmio Nobel com esse romance. 
Mas a leitura foi válida.

Namorando a Rússia

Os últimos dois anos foram, definitivamente, anos da Rússia em minha vida. Tudo começou com o Dr Jivago que, confesso, não me cativou tanto assim, mas plantou a sementinha da curiosidade e me conduziu a Dostoievski.  

O primeiro contato com o grande realista russo já havia acontecido há alguns anos. Por indicação de um amigo e por vontade de conhecer o famoso Idiota, empreendi a leitura do romance. A leitura ficou pela metade e o livro ao Deus dará. A verdade é que por motivos práticos a empreitada não foi para frente. A edição era ruim, a cópia de outra edição de que dispunha era, de fato, uma cópia, sendo assim de difícil manuseio. 

Porém, tentei mais uma vez. Dessa vez com sucesso. Fiquei cativada pela ingenuidade do nosso herói, com a descrição mais do que detalhada do grande escritor que podia gastar mais de cem páginas em um só dia de história, sem, de modo algum, entendiar o leitor. Tantas facetas, tantos pensares e tantos angulos de análise, visão, descrição. Como pode um cara ser tão completo, profundo, contundente? E ainda vivendo naquelas terras gélidas.

"Se Dostoiévski viveu lá na Sibéria e não se congelou (...)  se Dostoiévski vivendo na cadeia a tudo observou..." (Wandi Doratiotto)

Então, daí, foi um pulo para que me visse apaixonada, obcecada por sua obra. Foi uma fúria, um consumismo exacerbado de romances russos. A dificuldade, no entanto, existia. Ler e pronunciar os nomes, tantos nomes, e tão longos e consonantais foi difícil. Mas venci. Entre Nastássias, Dimitres, Anuchas, Ivans, Raskólnikoves e outros mais, acabei por me familiarizar. Hoje, penso, gostaria até de ter um samovar em casa!  

De Dostoievski passei a Tolstoi, Gógol e outros. E tantos ainda por vir... Tuguernieves, Pushkins, Lermontóves...

A Rússia me cativou. Até assisti à animação Anastásia! Logo eu que não gosto de animações. Essa é a prova cabal de que a Rússia me cativou.

Boris Pasternak
Dr Jivago
Mikhail Bulgákhov
O mestre e Margarida
Dostoievski
O adolescente
Noites brancas
Os demônios
Humilhados e ofendidos
O jogador
Crime e castigo
Memórias de subsolo
Os irmãos Karamázov
e tantos outros contos... 
Tolstói
Anna Karénina
Gógol
O nariz
Almas mortas
Nikolai Leskov
Lady Macbeth do distrito de Mtzensk

Vozinhas estridentes e perguntas pertinentes

Esta semana a minha turminha do segundo ano de Português aprendeu e praticou o uso da letra H. Meu desafio é sempre o mesmo: desvincular o som, ou melhor, a ausência do som da letra H inicial no português do som da letra H inicial no inglês. O desafio requer insistência apenas. Mas o interessante foi o surgimento de duas perguntas por parte dos pequenos. Perguntas pertinentes, inteligentes que acabaram por me deixar com cara de interrogação por alguns segundos. Transcrevo-as."Miss, se a letra H não tem som, por que nós precisamos escrever as palavras com ela?" e "Miss, se a letra H tivesse som, que som seria?"
Ótimas! Por isso que amo as crianças.